A fome

Gustave Courbet, "A onda" (1869)
Museu de Arte de Lyon

Pedro Ando

A fome d’alma humana
é um rei que se assenta à mesa verde-escura,
e come dos manjares em pratos de vacância. 

(Ele projeta a sua imagem em toda a estrutura.)

A glória fugidia de sua fugaz herança
clareia toda a sala. Portas abertas. Vem a cruviana
esvaziando-a de sua auréola,
e enchendo-a repetidamente da mesma fome.

Sua face dourada se perde em cores parcas
voando para longe. E, sem nenhum desnome,
se deita sozinho nos cacos da bonança
tendo no peito uma única gravura:

“Tudo vem, tudo vai, nada pra sempre dura,
A não ser aquilo que do céu vem – a própria fome”.

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