Lino Guedes
Sorriso do captiveiro
E quando a Babá estava,
com o sinhozinho brincando,
é que o filho achegava,
e com inveja olhava,
o que lhe ia desfrutando.
Sem palavra proferir,
creio que talvez de medo,
o negro punha-se a rir,
pr'a depois logo se ir
tristinho, a chupar o dedo...
Desespero
Apesar de seus cuidados,
em uns tempinhos roubados
do eito em que trabalhava,
sua criança, coitada,
uma certa madrugada
no céu azul descansava...
Sentidamente chorou,
com coisa alguma importou,
dizendo, mesmo, ao feitor:
- Se Deus me desse o destino
que Ele deu ao meu menino
lhe agradecia o favor...
Canção da dor
A mãe não pôde conter
um soluço dolorido,
quando lhe foram dizer
com o coração a bater:
- O seu filho está vendido!
Sinhozinho então desperta
e, para o acalentar,
a infeliz co'a alma aberta
por envenenada seta
se pôs bem terna a cantar.
Meu Deus, mas quanta tristeza
naquela doce canção!
Ninguém sabe com certeza
se aquela sutileza
é cantiga ou oração!...
Triste vigia
A negra canta baixinho,
com uma voz sufocante,
embalando o Sinhozinho,
que da mãe não tem carinho,
nem nunca teve, um instante.
E vai, assim, todo o dia,
e vai também toda a noite,
sem que esta triste vigia,
que só dores compendia
compadecida alma açoite!
Por mais que a escrava reprima,
lágrimas vão escorrendo.
- Contanto que isto redima
a minha Raça que se prima,
em ir banzando e morrendo...
O comboio
Ajuntamento sinistro,
com o qual o registro
de um que para atrás ficou,
como o secreto lamento
que mal diz do sofrimento
dos que a Desgraça marcou...
E lá se vai o comboio
correndo para o seu Norte
consigo mesmo dizendo:
- Já estou forte! Já estou forte!
Quem quiser venha comigo
para a Vida! Para a Morte!