Cecília Rogers
No primeiro dia
uma gota de sal deslizou
na aridez da paisagem
] insondável o silêncio dos grãos
e a sede das estrelas [
havia no ar
o mistério da mulher nascente
‒ lúcida criação do amor
havia a língua vertiginosa da terra
a lamber um coração faminto
e a multiplicar nos olhos
o dorso líquido das águas vivas
no primeiro dia
da lágrima fez-se o desejo
] indecifrável a textura das florações
que se anunciam [
efluviosas e famintas
No terceiro dia
entre linhas de sangue
e espasmos oriundos da noite
artérias incendeiam a aurora
a névoa se abre para a frenética beleza
feixes de múltiplos sóis
refletidos no espelho d’água
uma mulher se faz pela pulsação
das línguas feridas
e dos frutos secos do silêncio
ainda assim ela renasce
linhagem faminta das águas
submersas
DA RESPIRAÇÃO
das entranhas de fogo e areia
emerge o sopro da vida
lábios quentes gestam o ar
ápice do vento
que trama a tempestade e levanta a alma
entre istmos fluorescentes
a respiração das águas salinas
invade a secura da terra