Proust chato, Clarice pretensiosa, Guimarães insuportável etc.

Marcel Proust

Evando Nascimento Camacã

Li, entre o espanto e a concordância, alguns posts de leitoras e leitores falando da chatice de À la recherche du temps perdu, de Proust, que ganha neste momento novas traduções, sob a responsabilidade da ilustríssima Rosa Freire D’Aguiar e do ilustríssimo Mario Sergio Conti. Não estou mais sozinho! Concordo inteiramente: é uma aporrinhação sem fim a fala rememorativa de um narrador que se esbalda em frases intermináveis, ao longo de sete alentados volumes! Para quem busca uma leitura leve e prazerosa não é nada recomendável encarar esse monumento de cem anos, muito menos no original…

Mas aí me dei conta de que pelo menos metade das autoras e dos autores que me fazem companhia há décadas são uns chatos, pretensiosos e insuportáveis: Clarice, Goethe, Shakespeare, Woolf, Homero, Hilst, Beckett, Machado, a lista é longa, e por isso paro por aqui. Se me debruçar sobre a filosofia, a coisa então piora: como alguém pode se interessar ainda hoje por Platão, Aristóteles, Kant, Derrida, Beauvoir, Foucault, Arendt e tantos outros pensadores e pensadoras maçantes?!…

Lembro do suplício (delicioso é verdade: devo ser masoquista) que foi atravessar as seiscentas e tantas páginas do Grande Sertão: Veredas, de Guimarães, quando tinha apenas dezoito anos. Como aquele escritor-médico-diplomata pedante foi inventar uma linguagem que nunca existiu? Precisei logo de uma segunda leitura para entender que aquilo era a narrativa de um simples jagunço aposentado – vejam o despropósito… É verdade que, depois de tantas releituras, hoje leio o GS:V como se fosse folhetim de cordel. Ou me tornei também um chato de carteirinha ou a questão é bem outra.

(Comento de passagem A montanha mágica, de Thomas Mann, que li um pouco antes, aos dezessete anos: como tiveram coragem de atribuir o Nobel ao autor de um romance sem enredo, sobre a rotina de pacientes no lugar mais tedioso do mundo – um sanatório nos Alpes suíços?…)

E o Ulysses, de Joyce, o “Un coup de dés”, de Mallarmé, alguém em sã consciência pode dizer que de fato “leu” esses textos complicadíssimos? Juro que tentei, fui até o final, mas até hoje estou meio zonzo por causa de tanta sofisticação, digamos, “metida a besta”. Não preciso mencionar o “terremoto literário” que é o Finnegans Wake. Muita razão tinha Paulo Coelho quando faz alguns anos desqualificou sem pudor o escritor irlandês.

E o que dizer da Paixão segundo G.H., de Clarice? Páginas e páginas de uma mulher torturada porque comeu uma barata! Lembro de uma conversa com um famoso escritor brasileiro contemporâneo, o qual, num jantar na casa dele, me disse que achava Clarice muito pretensiosa por querer fazer filosofia com literatura. Concordei de imediato com seus altos comentários e ainda acrescentei alguns argumentos para NÃO SE LER JAMAIS a pseudofilósofa Clarice Lispector. Pura perda de tempo a minha ter escrito um livro sobre essa judia-ucraniana-brasileira e ter outro a caminho.

Poderia continuar tecendo inúmeras considerações contra certa canonização de escritas absolutamente anódinas – ou alguém acha que pode ter alguma importância as memórias de um canalha que escreve no além-túmulo? Somente rindo…

Quem me conhece sabe que me interesso por vários tipos de literatura ou qualquer produção cultural que julgue relevante. Por exemplo, o vasto universo POP: das artes aos quadrinhos, passando pela música, cinema etc. Desde criança frequentei universos mui distintos e não me arrependo de nenhuma de minhas escolhas, algumas delas nada canônicas. Umas até obscenas.

Concluo dizendo que realmente deve ser puro masoquismo meu ainda hoje reler com gosto a Recherche, sobretudo o último e inacabado volume Le temps retrouvé (traduzido precariamente como O tempo redescoberto), o qual considero um dos cinco livros que mais abriram as portas de minha limitada percepção do mundo (e da literatura).

Feliz Páscoa, de preferência sem Proust, Woolf, Hilst & cia.!


P.S.: apesar da chatice declarada acima, adorei as falas de Rosa Freire e de Mario Sérgio na última terça-feira na ABL. Imagino o quão primorosas estão essas novas traduções.

P.S. 2: advirto que este post não contém ironia e deve ser levado muito a sério.

P.S. 3: faz tempos que não encontro o tal escritor, não sei se mudou de opinião sobre a literatura de C. L., mas o fato é que desde então perdeu muito da fama – a culpa decerto é da chatice alheia.

Texto publicado originalmente na página pessoal de Evando Nascimento Camacã em seu Facebook e reproduzido aqui com autorização do autor.

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Safo 31

Tradução do fragmento 31 de Safo.

Um ônibus em direção ao caos

“E, em seguida, ao menor movimento, aquilo se desbota, se esfumaça no nada”, um conto inédito de Rodrigo Hoff.

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