Revista de Cultura

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Poemas-prosas

Ottavio Leoni, "Caravaggio" (1621-25)
Biblioteca Marucelliana, Florença

Marina Alexiou

“A todos vocês que dividiram a sua sombra comigo
E mostraram caminhos tão humanos...”
Nos meus olhos e no meu olhar 
vivem a tristeza da inclemência 
do tempo, da natureza, 
e a certeza de que o estranho riso
que brota dos meus tantos eus
é irmão desses espantos diante do gigantesco.
A todos que se aproximaram da minha sina
abro espaço aos seus pés cansados,
suas vestes rotas e seu imerecido martírio.
À sua volúpia, contida em estudados disfarces
e para a generosidade e sabedoria
diante daquilo que se impõe
de forma definitiva.
Mas que poucos verão...
Eu lhes apresento ao mundo que não passa 
de uma colcha de memórias, 
onde o jogo de luzes das trevas
e da beleza refletem e acendem
ainda outras, através das gerações.
O meu hálito, este que carrego
em densas nuvens tempestuosas
sopra entre abismos que não permitem descanso.
Os gritos, uivos de surpresa e dor, 
são os raios que antecedem a verdade
que será contada continuamente
por outros, que, assim como eu
(o Louco com o saco dos destinos humanos às costas)
dirigem-se em sua direção,
sem escolha...
< para Micheli da Caravaggio >

Aquele sabor do invisível

Todo simulacro é algo de ausência 
de perda daquilo que é único
mergulhado no mar da fluidez das aparências

Você se foi. Se perdeu.
Por quê?

E se corrermos até perder o fôlego
a floresta iria rir de nós, novamente?

Na fixidez do seu olhar 
você se reconheceu no espelho dos meus olhos

No invisível 
da sua face escondida até então...

Dentro de olhos estrangeiros
que te refletiram
com a luz do sorridente engano
da voz daquela floresta

onde corríamos a nos camuflar 
da dúvida e do espanto da existência...	
Hoje ela nos olha firmemente
através das suas pupilas brilhantes
como um destino ainda a descobrir.

Chegaremos lá?

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