Revista de Cultura

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Fica 2024: Diário de viagem, dia 3

FICA 2024: Forum de Cinema / Narrativas do Brasil
(Foto: divulgação)

Miguel Forlin

Meu terceiro dia em Goiás Velho foi quase todo dedicado a conhecer mais a fundo a cidade. Andei por horas a fio (mais do que já havia andado na terça-feira), tomei bastante sol goiano (estou com o rosto, os braços e as pernas ardendo) e me entranhei em becos e vielas (diferentemente do primeiro dia, em que permaneci na região central). Para me auxiliar nessa tarefa de caráter histórico, geográfico, antropológico etc., comprei, em uma charmosa livraria (a única de Goiás Velho, pelo que ouvi), Goyaz: de arraial a patrimônio mundial, de Elder Camargo de Passos. Ótima leitura, ótima companheira de viagem, ótima fonte de conhecimento.

No entanto, só vou falar mais detalhadamente do meu fascínio pela cidade no último texto – pretendo me despedir dela em grande estilo e de maneira melancólica (despedidas me entristecem, ainda mais quando tenho de ir embora a contragosto). Hoje, usarei este espaço para fazer uma única coisa: expor de modo breve a minha filosofia pessoal sobre festivais de cinema – mais especificamente, sobre aquela que considero ser a melhor forma de acompanhá-los (meu comentário acerca do filme a que assisti hoje aparecerá no texto de amanhã).

Vamos a ela!

Como vocês podem imaginar, frequento festivais de cinema há bastante tempo já. Há anos, eles fazem parte da minha vida e eu da deles. Contudo, sempre me perguntei qual seria o melhor jeito de aproveitá-los. Muitos frequentadores regulares têm a mesma dúvida. Já a ouvi diversas vezes, e de diferentes pessoas. Trata-se, na verdade, de um dilema, e, apesar de ele variar de acordo com a programação e o contexto, a questão central nunca muda: como monto a minha agenda?

Para quem não os frequenta regularmente, tudo isso pode parecer uma enorme besteira, mas, acreditem, não é! Pelo contrário, é algo realmente angustiante. Devo assistir aos filmes mais esperados pelo público ou aos menos conhecidos? Devo rever na tela grande filmes que já vi e de que gosto ou filmes a que ainda não assisti? Devo priorizar obras de grandes centros cinematográficos ou de países periféricos? Perguntas e mais perguntas… A verdade é que levei anos para chegar a uma solução, e, até obtê-la, frustrei-me diversas vezes. Infelizmente, não dá para assistir a toda a programação (pelo menos, não de modo frutífero), e escolhas precisam ser feitas.

Mulangos de Angola (foto: Lucas Diener)

No caso do FICA, a situação é ainda mais complexa, pois tanto a cidade quanto os eventos paralelos (como, por exemplo, as apresentações musicais, os debates e as manifestações culturais) são extremamente chamativos e atraentes. Entretanto, cheguei, enfim – como disse –, a uma solução (há uns cinco anos), e, desde então, aquela angústia sumiu. Foi um caminho árduo e tortuoso, mas havia uma recompensa do outro lado, e, do seu surgimento em diante, ela só meu deu alegrias e satisfação.

Que recompensa? Esta: atualmente, guio-me somente por minhas vontades e por um respeito às minhas limitações. Em primeiro lugar, monto a minha agenda a partir daquilo que realmente desejo ver – o interesse por uma determinada obra sempre é um dos meios mais efetivos de me aproximar dela e da arte de maneira geral; em segundo, só me restrinjo se, em um único dia, a quantidade de filmes a que quero assistir é maior do que três, pois notei com o tempo que, mais do que isso, as sessões se atropelam, a concentração diminui consideravelmente e o cansaço bate.

Ou seja, o truque foi optar por uma postura real e genuína, inteiramente alinhada com os meus interesses, em detrimento de um mero acúmulo quantitativo. Um festival de cinema não é uma maratona, e sim uma oportunidade especial de respirar cinema por certo período. Não importa o número de filmes a que assisto; o que importa é a qualidade da relação que estabeleço com eles. Independentemente de seus méritos – uma vez que a motivação inicial é sempre verdadeira, e não só uma resposta automática a um impulso empilhador –, uma única obra vista em um festival é mais do que suficiente para justificar minha ida a ele.

Tenho encarado o FICA exatamente dessa maneira, e o resultado não poderia estar sendo melhor!

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