Marina Alexiou
Mulher na janela
Entre aquele espaço diminuto ela vê, na distância, as suas ilusões na forma de um oceano cristalino. Que reflete as suas memórias mergulhadas em pensamentos e imagens, que rodopiam, numa apresentação em tenda de chão seco e poeirento. Perdida num lugarejo repleto de curiosos que espiam entre as frestas... da sua imaginação. Ela encara, através daquelas águas, o colorido do inesperado que transforma todo o seu interior trazendo beleza e esplendor aos seus devaneios. Ela encara, através daquele balcão, a sua condição de mulher, de musa, de artista de habitante daquele mar imaginativo que é a sua mente... O horizonte visto a partir daquela paisagem mental é vasto, convidativo, tanto que poderia permanecer lá, indefinidamente, contemplando o seu cuidadoso coração e a sua temerária sorte, tão possivelmente cruel quanto o calor dos raios ensolarados. É o exercício erótico que a impele a estar lá, sozinha e atenta, entre aquela multidão de curiosos que povoam os seus sonhos e o espetáculo diariamente apresentado para si mesma onde o roteiro é sempre inédito e desconhecido...
Lendas
A guardiã do templo de Apolo se aborrece em sua jornada. O céu escurece nas tardes romanas de Istambul. Uma gaivota dá um rasante em busca do peixe, e os ventos rodopiam em algum lugar nos confins do oceano. Tudo ao mesmo tempo - pois o tempo é uma ilusão - configura um desenho à moda de um caleidoscópio. Em um próximo giro, as cores do céu, o apetite das aves e o destino das estrelas estarão transfigurados. O templo de Apolo há muito não terá guardiã. Seus livros se perderão entre a poeira das eras... Aquele que tudo vê lança um olhar entediado aos tantos contos de fadas que criamos para falar sobre o que nunca conheceremos. Sem dispensar o sorriso de ironia cúmplice vindo do Olimpo. Assim se sucedem as paisagens e os olhares que suplicam por respostas... O caleidoscópio continua sua volúpia. Os ventos espalham os mistérios aos quatro cantos. As aves, assim como os humanos, se esforçam na sua caça pela sobrevivência. E a guardiã desconfia que seu aborrecimento será eterno... < We all walk the long road >