Victor Hugo Geraldino
Terceto à Lua:
Crava tuas faíscas sobre a terra: Nos montes sobrevém teu vestido De graves e alvos voejos tecido. Cintila teus laureis sobre os picos Das lãs, serras e árvores altivas Tornando pálida a noite e viva. Teu semblante nas águas volita E caminha junto às ternas ondas No mistério da noite erudita. De celeste prata és tua feição Planando na brisa do espaço - Reinando no céu da solidão. Não morrerás com a noite, Lua! Quando rebentar a nova aurora Tu levantar-se-á na minha alma.
01/03/2023
Aos poetas
Tudo para ti muda-se em poesia Desde a loucura à razão formosa; Desde vil gemido a elevados cantos Das aves na luz matinal e airosa. Na tempestade de chuva e tristeza A rociar a alma de rasgo num dia Torna-te a redigir como perdido; Torna-te a compor, ébrio, poesia... Quando virá nosso recanto eterno, E nosso descanso na alcova infinda? Gozamos! O inverno não é eterno! Receberemos o laurel que finda Nosso gemido na noite escondida, Nosso malgrado na sina perdida!
01/03/2023
Elegia da despedida
(Àquela que não posso nomear)
Tu brotaste em mim, flor no deserto, Como um lírico canto a ressoar No toldar da noite solitária, E no chorar das almas perdidas. Na cintilante aurora vigorosa Tua voz consumaste a estrela d'alva Com tua marcha de formosura. Tua mão enlaçada à minha Orvalhou minha pobre poesia. E, ó Musa de vestido inexato - Meu alento no perdido alvorecer -, Sinto teus passos silenciosos, Mansos de bruma solene, A vagar no meu coração. Sinto tua voz cândida e calma A sobressair como sinfonia triste Nos meus abstrusos ouvidos. Quem foste tu? Quem és tu? Tu és os sonhos delirantes Dos meus olhos doentes. Musa, tua perpétua despedida Foi um maremoto eversivo Sobre meu vago espírito de poeta. Sou o aflito batel no porto d'alma; Meu coração é um relógio pendido Contando as horas da morte. Mas ainda vejo tua pálida face Nas horas silenciosas do tédio insonte Como espectro venturoso, Ainda que persistas na despedida. Minha dama negra, te digo, ainda Que na fúria não me ouças: Tu és minha poesia carnal, E na minha memória saudosa Tu és, ausente, minha dama real, - À qual nunca direi adeus.
09/03/2023